TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA
IMPULSIONADA PELO DESIGN
Contributo para a inovação
Maria
João MELO,1
Fernando Moreira da SILVA,1 José Monteiro BARATA2
1 CIAUD, Faculdade de Arquitectura, TU Lisbon
2 Instituto Superior de Economia e Gestão, TU Lisbon
Sumário
O artigo trata da criação de um sistema organizacional para incrementar o fluxo de
transferência de tecnologia entre instituições públicas com as instituições
privadas da infra-estrutura de inovação comum, por incluir o design como factor
integrador do conhecimento. Tem o objectivo de transformar ideias inovadoras em
produtos e serviços transaccionáveis pelo poder empático criado com o
consumidor através do design-thinking,
articulando os factores humanos, culturais e comunicacionais com as necessidades
e oportunidades do mercado, em benefício da cultura de inovação, pela dinâmica
de transferência de tecnologia das universidades para a indústria
transformadora. Este sistema propiciará o fabrico de produtos com um
grau de inovação mais elevado, diferenciados pelos activos intangíveis que
advêm da introdução da actividade do design que, assim, sendo de nível
estratégico, contribuirá para a valorização económica dos recursos nacionais
por via do aumento do valor dos produtos exportados, dos quais depende a
produtividade da economia. A adopção do modelo organizacional proposto sedeado
nos Centros Tecnológicos, ampliará o seu papel ao de catalisador, de
articulação e de coordenação de projectos inovadores entre a indústria
transformadora e o ambiente científico e tecnológico nacionais, transformando o
conhecimento tácito em conhecimento explícito para efectivar a transferência de
tecnologia a produtos, serviços e/ou processos.
PALAVRAS-CHAVE
Transferência de Tecnologia, Design-thinking, Design
Estratégico, Cultura de Inovação.
1.
INTRODUÇÃO
A nível mundial, existe consenso acerca dos mecanismos inibidores da
transferência de tecnologia por terem sido identificadas e discutidas as causas
e os efeitos do distanciamento entre a investigação académica e o tecido
empresarial, a que o português, não é excepção. Ao leva-las em consideração sem
pretender interferir nas distintas vocações, objectivos, motivações e particularidades,
viabilizamos um sistema que promova a sua cooperação tendo como pilar a
actividade do design como recurso estratégico, a fim de transformar o
capital humano em capital estrutural. Será
um contributo para a aproximação destas duas comunidades isoladas por métodos
distintos, por linguagens específicas, por práticas, atitudes e visões diferentes.
Se um dos aspectos que afecta o processo de
transferência de tecnologia para a indústria nacional está identificado como sendo
o desenvolvimento de produtos com reduzida base científica então, o contributo da
metodologia do design-thinking na investigação
aplicada, auxiliará a posicionar novas ideias empresariais
e assegurará a sua comunicação, a par com
as instituições que desenvolvem a
infraestrutura tecnológica, contribuindo
para a criação das condições para que a sociedade portuguesa efectue as
mudanças organizacionais que contemplem a adopção do modelo de gestão de design
proposto por Nevado (2008), acessível a todos os seus sectores e dimensões, criando
valor pelo fabrico de bens com o grau de inovação adequado à necessidade da
maior produtividade.
2.
DISCUSSÃO
Em Mulet (2010), o processo de transferência de
conhecimento das Universidades para as empresas enfrenta pressões de vária
ordem que as impelem para novas dinâmicas, nomeadamente a financeiras. Os
orçamentos públicos cada vez mais limitados conduzem à procura de complementos
externos dos rendimentos, quer através de candidaturas para mais e novos fundos
para investigação, de estabelecimento de protocolos de colaboração em troca
participação no capital de empresas que possam a utilizar o conhecimento
académico e/ou obtenção de royalties. Por outro lado, a dinâmica acelerada de outros factores
contextuais como a procura do meio empresarial por conhecimentos em C&T e o
desenvolvimento de actividades económicas, cujas tecnologias têm progressivamente
uma maior base científica, assim como, a global propensão à colaboração,
partilha e integração em redes que constituem as novas motivações individuais
dos investigadores, leva a explorar as condições que parecem estar reunidas para
o aumento do fluxo de transferência de conhecimento entra universidade e a indústria
transformadora nacional. No entanto, para Câmara (2009) a generalidade do
tecido industrial não dispõe da liquidez nem de interlocutores necessários à
integração das contribuições de investigação com origem nas universidades, em
que é determinante conhecer os cenários previstos por peritos para quem depende
do fabrico de novos produtos. Para Martins
(2010), a existência de transferência de conhecimento
não é economicamente útil, por não se traduzir em bens com valor reconhecível
pelo consumidor global. Então, para que o aumento produtividade na indústria
transformadora nacional ocorra, pelo fluxo de captura contínua de valor, o
percurso efectuado pelo conhecimento incorporado tem que se traduzir por
progressos no processo a que Martin (2009) denomina de “navegação no funil do conhecimento”,
através do design
thinking que, através de uma série de escolhas, combinando ideias
distintas de diferentes domínios do conhecimento. Em Berger (2009), o design é acerca de infinitas possibilidades e,
talvez mais do que tudo ser acerca de optimismo, será das oportunidades e
benefícios da aplicação de conhecimento à produção de bens e consequente
aumento de produtividade nacional que nos ocuparemos.
De acordo com
Ilharco (2004), no actual mundo globalizado, os designers, tal como os artistas
e os investigadores, deverão actuar como antenas da sociedade, captando ideias
e os primeiros sinais de mudança, traçando novos territórios, convidando ao
risco, sendo simultaneamente inspirados e inspiradores de outros artistas. Por
suas vozes serem periféricas e marginais, arautos das coisas que virão, é neles
que reside a responsabilidade de atingirem a sensibilidade da sociedade.
Segundo
Baptista (1999), o actual contexto económico e social caracteriza-se também
pela globalização da competitividade. A promoção de uma cultura empreendedora e
da capacidade de inovar das empresas, funcionam neste contexto como
catalisadores de mudança, de competitividade e prosperidade económica, em que
os designers têm um papel determinante a desempenhar, dependendo das
oportunidades que vierem a ser criadas para que estes actuem como agentes de
mudança, com capacidade de acelerar a criação, a disseminação e a aplicação de
ideias inovadoras.
Visto Portugal dispor, segundo Iriondo
(2009), das infraestruturas necessárias para que a transferência de
conhecimento aconteça, este autor contudo recomenda a existência de uma estrutura de transferência de tecnologia
permanente e com quadro de funcionários próprio,
a fim de garantir quatro aspectos que considera serem indispensáveis. O
primeiro destina-se ao acompanhamento dos processos de transferência de
conhecimento; o segundo, para actuar com interlocutor; o terceiro como
agregador das equipes de investigação; e um quarto que tenha poder de decisão
para actuar como representante da Reitoria. Exceptuando a actuação junto da
Reitoria, propomos que os restantes papéis possam ser desempenhados
simultaneamente pela actuação do design conforme o que a figura 1 esquematiza.
Fig.1 – Transferência de Tecnologia
impulsionada pelo design
Propomos um sistema organizacional que, conforme a
figura 2, por integrar o design como recurso estratégico nos Centros
Tecnológicos Portugueses, favorece um ambiente para a intensificação e
conjugação das relações entre a indústria transformadora com as universidades
nacionais, e para que desta rede de participação se obtenha a aplicação do conhecimento assim gerado, a soluções com melhor desempenho a produtos e/ou processos, favorecendo
a cultura de inovação nacional. Assim, a indústria
transformadora poderá beneficiar mais do potencial dos vários actores que já o
constituem, assim como da articulação com os que, tal como os designers, no
futuro próximo justificaremos a integração, através da criação do trinómio organizacional que combina o design,
com a ciência e com a indústria
transformadora, congregando os quatro factores determinantes para a
competitividade segundo Porter (2007), a localização, a inovação tecnológica, o
modelo organizacional e a criatividade.

Fig. 2
– Trinóminio organizacional.
3.
CONCLUSÕES
Porque o sucesso de
uma ideia, ou a probabilidade de ocorrência de uma inovação com o
desenvolvimento de novos produtos, dependem do grau de convicção do emissor, mas
igualmente do interlocutor, do lugar e do tempo onde ela ocorre, esta
investigação é oportuna e inovadora por tentar clarificar e reforçar o estatuto
profissional do designer na indústria transformadora portuguesa por um lado, e
por outro, por justificar a poupança de recursos, por se poder proceder,
através de ajustes na instituição Centros Tecnológicos, à adequação do design
estratégico como elemento da economia de mercado, a introduzir nesta
pré-existente infra-estrutura, assim como, identificar e caracterizar os
mecanismos necessários para que nesse ambiente ideal, se opere a almejada
mudança.
Deste modo, atribuimos
ao designer, através dos mecanismos cognitivos e emocionais inerentes à sua
actividade profissional, um papel determinante como agente de mudança,
alargando as fronteiras do design à de liderança e de coordenação de projectos
estratégicos. No entanto, para que se possa acelerar o ritmo a que a inovação
acontece, assim como o grau e as qualidades da mesma, torna-se central poder
provar a validade da questão de investigação: “Poderá a actividade do design de nível estratégico, satisfazer a
necessidade de inovação da indústria transformadora nacional?”. Tudo indicia
que a hipótese se confirme: “Os Centros
Tecnológicos são, como infra-estruturas do sistema nacional de inovação, as
instituições adequadas para a gestão de um modelo organizacional que integre
como recurso estratégico para impulsionar a inovação na indústria
transformadora nacional”.
Naturalmente, o
potencial do sistema para a transferência de tecnologia através do modelo
organizacional proposto deverá ser avaliado levando em consideração as
limitações do presente documento, que corresponde a uma fase por concluir da
investigação.
6.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos à
Fundação para a Ciência e da Tecnologia –FCT o financiamento através da
atribuição de bolsa individual em C&T, com a referência SFRH/BD/45464/2008.
7. REFERÊNCIAS
[Berger09] W. Berger. Glimmer: How Design Can Transform Your Life,
and Maybe Even the World. The
Penguin Press HC. s/l: 2009.
[Câmara09] A. Câmara. Voando com os Pés na Terra. Bertrand. Lisboa: 2009.
[Ilharco04],
F. Ilharco. A Questão Tecnológica: Ensaio sobre a Sociedade Tecnológica
Contemporânea. Principia. Lisboa: 2004.
[Iriondo09] W. Iriondo.
Transferência de conhecimento da universidade para a sociedade através do
tecido empresarial: um estudo da situação em Portugal. Pós-Doutoramento em parceria entre o Centro de Investigação em
Sociologia Económica e das Organizações (SOCIUS), da Universidade Técnica de
Lisboa, e o Instituto de Pesquisas e Estudos em Administração Universitária
(INPEAU), da Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil. Lisboa: 2009.
[Martin09] R. L. Martin. The Design Of Business: Why design thinking is
the next competitive advantage. Harvard Business School Press. Boston: 2009.
[Martins10] J. M. Martins. Gestão Do Conhecimento: Criação e transferência
de conhecimento. Edições Sílabo,
Lisboa: 2010.
[Mulet10] J. Mulet. Barreras en la
cooperación Universidad-Empresa en Portugal y España: Medidas para la eficacia
de la transferencia de conocimiento. Conferencia Universitaria Ibérica sobre
Transferencia de Tecnología, COTEC. 30 de Novembro. Huelva: 2010.
[Nevado08] P. Nevado, J. Barata, R. Almendra, et. al. The Igloo Model: a Challenge to Management and a
Contribution of Design to Business Competitiveness. Joint Conference of the 15th Annual International
Conference on Advances in Management & 1st Annual International Conference
on Social Intelligence. 16 a 19 Jul. Boston: 2008.
[Porter07] M. E. Porter.
Estratégia e Vantagem Competitiva. Público. Lisboa: 2007.